quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Educação e empatia em tempos de intolerância


Trabalho com educação há 13 anos. Nesse pouco tempo tive a oportunidade de circular por vários espaços de aprendizagem. Salas de aula, ONG's, academias de artes marciais, projetos sociais, e muitos outros. Nos últimos 3 anos tenho trabalhado junto  a estudantes do Ensino Médio com a disciplina de Sociologia. No 3º ano do Ensino Médio trabalhamos com conteúdos relacionados a Sociologia e Política. Quem estudou comigo nesses últimos anos deve lembrar que sempre no 3º bimestre (é o que estamos vivendo agora na escola) nós nos deparamos com o tema da cidadania, da luta por direitos e da atuação dos movimentos sociais. Como atividade final do bimestre proponho a apresentação de seminários sobre a atuação histórica de movimentos sociais como o negro, LGBT, indígena, feminista, e dos trabalhadores rurais. Alguns estudantes, ao se depararem com esses temas, ficam um pouco reticentes, e vêm com discursos negativos sobre alguns desses movimentos antes mesmo de conhecê-los. Entre concordâncias e divergências sempre temos conseguido fazer bons debates. A apresentação desses trabalhos me trouxe uma das experiências mais emocionantes que vivi como educador ao longo dos anos. Em uma apresentação sobre o movimento LGBT, uma das estudantes, ao relatar a problemática da violência contra esses grupos, se emocionou e caiu em lágrimas defronte a turma. Ela parou a apresentação do conteúdo e relatou como, durante a pesquisa, se deparou com dados e fatos que a fizeram rever sua visão com relação aos homossexuais, antes enviesada por uma orientação religiosa e por aquilo que havia crescido ouvindo os mais velhos falarem. Esse sentimento de empatia com a luta e com a dor do outro é o mais puro exemplo dos princípios de solidariedade e fraternidade que estão presentes no evangelho de Jesus, no altruísmo das ações (ou não-ações) proposto por tradições do pensamento oriental como o Budismo e o Taoismo, no lema da Revolução Francesa, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, e na Constituição Brasileira de 1988. Esses princípios encontram lugar hoje na escola. Só são possíveis através da educação (de dentro ou de fora da escola). Não sei se cheguei a dizer isso para aquela estudante na época, mas essa experiência e o seu relato me marcaram profundamente. Me fez ser mais humano. E ter a certeza de que através da educação e do respeito as diversidades poderemos sempre mais!

terça-feira, 23 de outubro de 2018

A triste força das fake news nas eleições 2018


Realmente as fake news tiveram um peso decisivo nessa eleição! Se ainda havia alguma dúvida, hoje pude ter a certeza disso. Hoje, andando pelo centro de Sousa, parei para tomar uma água de coco e refrescar um pouco do calor. O vendedor é pai de um ex-estudante do IFPB, do PROEJA¹. O filho dele foi meu aluno, e ele sempre gostou de perguntar como o rapaz estava indo na escola. Sempre que passo por ali o senhor me cumprimenta respeitosamente. Em meio a barulheira que estava no centro (uma loja ali perto com um paredão de som fazendo propaganda), como de costume, parei para conversar com ele. Perguntei como ele estava vendo as eleições, e se já tinha um candidato. Rapidamente ele me falou que votaria no Bolsonaro. Perguntei se ele aceitava receber um pequeno texto que tinha em mãos falando sobre o processo eleitoral recente, e ele aceitou. Pedi que lesse com atenção e mostrasse também para o seu filho. Ao defender o voto em seu candidato, ele mobilizou dois argumentos. Disse que era contra o Kit Gay, e que a vice do Haddad iria acabar com as religiões. Tentei argumentar um pouco, mas ele aprofundou ainda mais esse argumento dizendo que o candidato Haddad era contra as leis de Deus. Na hora me passou um turbilhão de argumentos, principalmente relacionados a experiência do seu filho junto a escola. O filho dele teve a oportunidade de estudar em uma escola pública federal, que foi reinventada pela gestão de Haddad no Ministério da Educação. Enquanto esteve lá, ele recebeu uma bolsa de permanência do PROEJA, alimentação em um contexto de dificuldades financeiras da família, acompanhamento psicológico em momentos de crise emocional, e uma séria de outros direitos sociais que lhe foram garantidos nesse período. Isso não foi nenhuma caridade. Foram políticas públicas educacionais que garantiram direitos. Infelizmente, duas fake news tiveram mais influência em seu voto do que todas as experiências concretas com as quais ele e seu filho tiveram contato. Em meio ao barulho que estava ali, vi a dificuldade de tentar argumentar na conversa, e pedi que ele pudesse ler o texto com atenção em casa. Ao me despedir, estendi a mão para cumprimentá-lo e, pela primeira vez em quase 3 anos que o conheço, vi um pouco de reticência em retribuir cumprimento. Senti um pesar enorme. As fake news tiveram uma triste força nessas eleições.


¹Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica