Trabalho com educação há 13 anos.
Nesse pouco tempo tive a oportunidade de circular por vários espaços de
aprendizagem. Salas de aula, ONG's, academias de artes marciais, projetos
sociais, e muitos outros. Nos últimos 3 anos tenho trabalhado junto a estudantes do Ensino Médio com a disciplina
de Sociologia. No 3º ano do Ensino Médio trabalhamos com conteúdos relacionados
a Sociologia e Política. Quem estudou comigo nesses últimos anos deve lembrar
que sempre no 3º bimestre (é o que estamos vivendo agora na escola) nós nos
deparamos com o tema da cidadania, da luta por direitos e da atuação dos
movimentos sociais. Como atividade final do bimestre proponho a apresentação de
seminários sobre a atuação histórica de movimentos sociais como o negro, LGBT,
indígena, feminista, e dos trabalhadores rurais. Alguns estudantes, ao se
depararem com esses temas, ficam um pouco reticentes, e vêm com discursos
negativos sobre alguns desses movimentos antes mesmo de conhecê-los. Entre
concordâncias e divergências sempre temos conseguido fazer bons debates. A
apresentação desses trabalhos me trouxe uma das experiências mais emocionantes
que vivi como educador ao longo dos anos. Em uma apresentação sobre o movimento
LGBT, uma das estudantes, ao relatar a problemática da violência contra esses
grupos, se emocionou e caiu em lágrimas defronte a turma. Ela parou a
apresentação do conteúdo e relatou como, durante a pesquisa, se deparou com
dados e fatos que a fizeram rever sua visão com relação aos homossexuais, antes
enviesada por uma orientação religiosa e por aquilo que havia crescido ouvindo
os mais velhos falarem. Esse sentimento de empatia com a luta e com a dor do
outro é o mais puro exemplo dos princípios de solidariedade e fraternidade que estão
presentes no evangelho de Jesus, no altruísmo das ações (ou não-ações) proposto por tradições do pensamento oriental como o Budismo e o Taoismo, no lema da
Revolução Francesa, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, e na
Constituição Brasileira de 1988. Esses princípios encontram lugar hoje na
escola. Só são possíveis através da educação (de dentro ou de fora da escola). Não
sei se cheguei a dizer isso para aquela estudante na época, mas essa
experiência e o seu relato me marcaram profundamente. Me fez ser mais humano. E
ter a certeza de que através da educação e do respeito as diversidades poderemos
sempre mais!
quarta-feira, 24 de outubro de 2018
terça-feira, 23 de outubro de 2018
A triste força das fake news nas eleições 2018
Realmente as fake news tiveram um
peso decisivo nessa eleição! Se ainda havia alguma dúvida, hoje pude ter a
certeza disso. Hoje, andando pelo centro de Sousa, parei para tomar uma água de
coco e refrescar um pouco do calor. O vendedor é pai de um ex-estudante do IFPB,
do PROEJA¹. O filho dele foi meu aluno, e ele sempre gostou de perguntar como o
rapaz estava indo na escola. Sempre que passo por ali o senhor me cumprimenta
respeitosamente. Em meio a barulheira que estava no centro (uma loja ali perto com um paredão de som fazendo propaganda),
como de costume, parei para conversar com ele. Perguntei como ele estava vendo as
eleições, e se já tinha um candidato. Rapidamente ele me falou que votaria no
Bolsonaro. Perguntei se ele aceitava receber um pequeno texto que tinha em mãos
falando sobre o processo eleitoral recente, e ele aceitou. Pedi que lesse com
atenção e mostrasse também para o seu filho. Ao defender o voto em seu
candidato, ele mobilizou dois argumentos. Disse que era contra o Kit Gay, e que
a vice do Haddad iria acabar com as religiões. Tentei argumentar um pouco, mas
ele aprofundou ainda mais esse argumento dizendo que o candidato Haddad era
contra as leis de Deus. Na hora me passou um turbilhão de argumentos,
principalmente relacionados a experiência do seu filho junto a escola. O filho
dele teve a oportunidade de estudar em uma escola pública federal, que foi
reinventada pela gestão de Haddad no Ministério da Educação. Enquanto esteve
lá, ele recebeu uma bolsa de permanência do PROEJA, alimentação em um contexto
de dificuldades financeiras da família, acompanhamento psicológico em momentos
de crise emocional, e uma séria de outros direitos sociais que lhe foram
garantidos nesse período. Isso não foi nenhuma caridade. Foram políticas
públicas educacionais que garantiram direitos. Infelizmente, duas fake news
tiveram mais influência em seu voto do que todas as experiências concretas com
as quais ele e seu filho tiveram contato. Em meio ao barulho que estava ali, vi
a dificuldade de tentar argumentar na conversa, e pedi que ele pudesse ler o
texto com atenção em casa. Ao me despedir, estendi a mão para cumprimentá-lo e,
pela primeira vez em quase 3 anos que o conheço, vi um pouco de reticência em
retribuir cumprimento. Senti um pesar enorme. As fake news tiveram uma triste força nessas eleições.
¹Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica
segunda-feira, 16 de julho de 2018
Todo homem precisa de uma mãe
Nos últimos dias essa música
tocou muito nos meus ouvidos e no coração. Ouvia ela chegando por entre a porta
do quarto todas as noites, enquanto minha mãe assistia à série "Onde
nascem os fortes". Estamos em processo de mudança de casa em Fortaleza. A casa onde moramos nos últimos 17 anos. A
casa dos meus avós. Quando essa música começava a tocar já podia observar minha
mãe adormecendo deitada na cama dela, ou na da minha irmã. Uma hora dessas ela já estava exausta. Muitas
coisas a resolver. Dias apressados. Todos últimos dias que passei em Fortaleza, quando estava
perto de chegar em casa ela me ligava para combinarmos o que iríamos jantar
naquela noite. Enquanto jantávamos a escolha da noite, fazíamos o balanço das
coisas que foram encaminhadas naquele dia, e pensávamos no que teríamos que dar
conta no dia seguinte. Quando nos mudamos da casa antiga eu estava com 17 anos.
Eu não era dos mais empolgados com aquela mudança. Os meus primeiros 17 anos de
vida foram passados na casa da Rua Eduardo Angelim, 388. Naquela mudança,
estavam junto com ela o Seu Geraldo e a Dona Zeza. Eles foram os pilares de
organização daquele processo junto com ela e meu pai. Eu só queria não me
mudar. Mas os quereres de um menino de 17 anos nem sempre são materializáveis.
O seu Geraldo e a dona Zeza não estão mais fisicamente por aqui. E 17 anos
depois, eu ainda tenho muitas dúvidas sobre mudanças, de casa, e da vida. Mas
sei que elas acontecem. A casa da Dona Zeza, da Dona Isilda, está recebendo uma
nova dona. Eu segui. Voltei. Segui denovo. Mas nós sempre seguimos. No plural. Então,
a casa que a dona Zeza deixou para todos nós continua seguindo. Estava tão
imerso nas lembranças, que o som da música não virava palavras nítidas nos meus
ouvidos. Ouvia "amor" no refrão. Mas ele dizia mesmo era "mãe".
"Todo homem precisa de uma mãe". Só depois fui perceber que a música
que embalou minhas lembranças nas últimas noites fala de mãe. De cuidado. De
lembrança... O saudosismo cessou um pouco. E me percebi feliz por ter tudo ótimas
mães. Que sempre tiveram muito cuidado comigo. E que me deixaram todos esses
anos de boas lembranças para levar adiante.
quarta-feira, 20 de junho de 2018
A alienação e o canteiro
Fui
ministrar aula hoje em uma turma do Ensino Médio, e ao chegar ao bloco de salas
percebi que a turma toda tinha se ausentado. Hoje é o último dia de aulas antes
do recesso escolar semestral. Parece que os alunos resolveram antecipar as
férias. Apenas um estudante me esperou para entregar uma atividade que havia
passado aula passada. Infelizmente aqui na escola essa situação de falta
coletiva de algumas turmas é recorrente. Os
estudantes combinam entre si, todos faltam a aula. Como de costume em situações
como essa, eu fico na sala durante o período correspondente a minha aula.
Afinal de contas, durante aqueles 50 minutos minha obrigação é estar à
disposição naquela aula. Sempre torço para aparecer uma ovelha desgarrada
daquelas que evadiram para tirar alguma dúvida em sala (até agora isso não
aconteceu). Enquanto esperava alguém aparecer, parei para escrever esse texto.
Pois bem. Não é sobre isso que eu quero falar. Enquanto estava defronte a sala, um estudante do curso superior de Agroecologia passou para conversar comigo. Ele havia cursado a disciplina Sociologia Rural comigo em 2016. Entre um proseado e outro, me mostrou as fotos do canteiro econômico que está desenvolvendo para sua pesquisa de TCC. Falou que estava fazendo de tudo um pouco: capinando, cavando buraco etc. Relatou que agora estava entendendo melhor o debate sobre alienação no trabalho que estudamos durante a disciplina. O projeto fez ele ter contato com todos os elementos daquela dinâmica produtiva, desde a concepção intelectual até os aspectos técnicos e práticos da operacionalização do canteiro. Com muito orgulho ele estendeu as mãos calejadas para me mostrar um dos frutos do seu trabalho árduo. Mesmo após os colegas tirarem onda por ele estar trabalhando com uma enxada. Tudo agora fazia mais sentido. A teoria de Karl Marx, dinâmica produtiva do canteiro econômico e os pormenores do mundo trabalho.
Das pequenas e grandes revoluções diárias que a educação nos proporciona..
Pois bem. Não é sobre isso que eu quero falar. Enquanto estava defronte a sala, um estudante do curso superior de Agroecologia passou para conversar comigo. Ele havia cursado a disciplina Sociologia Rural comigo em 2016. Entre um proseado e outro, me mostrou as fotos do canteiro econômico que está desenvolvendo para sua pesquisa de TCC. Falou que estava fazendo de tudo um pouco: capinando, cavando buraco etc. Relatou que agora estava entendendo melhor o debate sobre alienação no trabalho que estudamos durante a disciplina. O projeto fez ele ter contato com todos os elementos daquela dinâmica produtiva, desde a concepção intelectual até os aspectos técnicos e práticos da operacionalização do canteiro. Com muito orgulho ele estendeu as mãos calejadas para me mostrar um dos frutos do seu trabalho árduo. Mesmo após os colegas tirarem onda por ele estar trabalhando com uma enxada. Tudo agora fazia mais sentido. A teoria de Karl Marx, dinâmica produtiva do canteiro econômico e os pormenores do mundo trabalho.
Das pequenas e grandes revoluções diárias que a educação nos proporciona..
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